quinta-feira, 8 de maio de 2008

Usina de Belo Monte - O alto preço da "energia barata"

Em meio a dossiês e cartões corporativos, Dilma Roussef atual Ministra da Casa Civil (e Ex- Ministra de Minas e Energia) anunciou o andamento dos trâmites legais para a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte (no Pará). A Ministra faz grande esforço para que os estudos de viabilidade da obra saiam o mais rápido possível, e que seu leilão seja realizado ainda em 2009.

A obra é prevista para o ano da Copa no Brasil (2014).

Tentando resumir o problema:

O Governo Federal, prevendo o possível colapso energético no Brasil nos próximos anos, tratou de acelerar o andamento de projetos de geração de energia. Os projetos desta natureza, quando prontos, aumentariam em 29,7 Gigawatts a atual oferta energética do Brasil. Deste montante, 11,1 Gigawatts viria somente de Belo Monte.

Como assim "viria"?

Aí está o "pulo do gato".

A obra já havia sido apresentada no final dos anos 80 como "Usina Kararaô", um "Elefante Branco" que teria um lago "monstruoso" de 1.200 km quadrados, inundaria extensa área às margens do Rio Xingu, Terras Indígenas (dos Kayapó) e grandes áreas de equilíbrio ecológico muito frágil . Sem contar o impacto direto ou indireto em mais de 3 mil famílias que sobrevivem do rio na periferia das cidades de Altamira e Vitória do Xingu (ambas no Pará).

Em uma das audiências públicas, a índia Kayapó de nome Tuíra, se revoltou com os técnicos da Eletronorte e "esfregou" seu facão na cara de um deles (foto abaixo). A imagem da "índia guerreira" rodou o mundo e o Banco Mundial retirou seu apoio à obra, interrompendo o projeto.


Com seu facão em riste, a índia Tuíra Kayapó protesta contra a construção da Hidrelétrica de Kararaô ( atual Belo Monte) no Rio Xingu . A imagem foi responsável pela desistência do Banco Mundial em bancar o projeto, inviabilizando-o.
Com a crise energética dos anos 2000, o projeto voltou à pauta.
Agora diferente, "mais moderno" . Seria a primeira Hidrelétrica deste porte com a tecnologia "a fio d'água", ou seja, "quase sem lago" (no atual projeto ele teria "apenas" 400 km quadrados, 1/3 do original), sem perda da capacidade de geração energética, segundo os técnicos que idealizaram o projeto . Menos terras alagadas, índios e eco-chatos felizes, certo?.

Teoricamente sim. Teríamos menor impacto ambiental e a saia-justa criada pela índia Kayapó não seria repetida.

Ocorre que o Xingu é um Rio diferenciado, "vivo", que modifica sua estrutura durante o ano. Passa boa parte do ano "seco", e durante os 3 meses do período de chuvas ("inverno amazônico") multiplica seu tamanho e sua vazão.

Sem o lago de armazenamento, a Hidrelétrica estaria mais sujeita ao ciclo hidrológico do rio e durante 9 meses do ano funcionaria com capacidade reduzida. Os tais 11 Gigawatts de energia gerados na época chuvosa caem para menos de 4 Gigawatts nos períodos de seca.

O Governo busca esconder tal informação por motivos óbvios.

O que o Governo divulga como "produção de energia firme " é, na verdade, "potência máxima" de geração.


Seriam, na verdade, 9 meses de obra sub-aproveitada.

Isso sem contar o impacto na área do projeto, que diminuiu, mas ainda existe.... O barramento do Rio Xingu, mesmo em pequena escala, mudaria sua frágil estrutura e afetaria tanto pessoas como a Natureza a quilómetros da área da obra.

A Hidrelétrica de Belo Monte é a primeira de uma série de obras de grande porte planejadas para o Rio Xingu, se concretizada, pode significar o "início do fim" desta Bacia Hidrográfica.

Interesses financeiros (e/ou eleitoreiros) devem ser calculados com mais critério, pois há a relutância de diversos setores do Governo Federal para que "algumas verdades" sejam explicitadas.

O interesse governamental é o de suprimir o aparecimento de novas "índias Tuíras".

A energia Hidrelétrica não é uma energia limpa, e fica "mais suja" quando esse tipo de informação vem à tona.

Falta clareza no processo decisório desta obra. A nuvem do dinheiro não pode obscurecer a razão humana. Há muitos outros interesses em jogo que pouco têm a ver com o o aporte financeiro envolvido. É preciso ponderar muito para que se chegue à soluções REALMENTE viáveis ponderando a equação Custo (ambiental inclusive) X Beneficio .

Enquanto isso, aguardamos.....

(Há uma "bíblia" sobre a obra de Belo Monte e seus impactos. Livro escrito pelo engenheiro e professor da Unicamp Oswaldo Sevá - meu tio - que reafirma informações contidas neste artigo com gráficos e dados. A quem interessar, divulgo o nome da publicação e como adquiri-la).
(foto da Audiência da Eletronorte em Altamira-PA , 1989, retirada do site do Instituto Socioambiental)

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